Diz-me por quem te enlutas, dir-te-ei pelo que lutas.
O corpo de Rui Nabeiro, agora dentro do cemitério, e por isso já inteiramente dentro da História, exemplifica melhor que ninguém a unidade normativa e patriarcal de um país inteiro.
Perdoem-me enveredar por este exercício tétrico, mas a morte do empresário Rui Nabeiro fez-me pensar em corpos e cemitérios.
É que, contrariamente ao que se possa pensar, não é nos passadiços secos do nosso verão turístico nem nas tijoleiras frias do nosso inverno doméstico que encontramos o cerne da questão. É nos cemitérios de mármores sujos que melhor nos guardamos, por entre anjos comovidos e epitáfios desgastados. É aí, ou a caminhar lentamente para aí, para esse palco desleixadamente português de campas, lajes e loisas, cruzes e flores de plástico, que vem ao de cima o que realmente nos (co)move: a vontade unânime de nos unirmos num xi-coração apertado à volta de um patriarca milionário.
Confesso que fui apanhada de surpresa pela forma como este dia dos Pais foi sendo tomado pelo poder centrifugante do poder económico, e como este poder foi ganhando força com a ajuda de palavras como “império” e “café”, tão grávidas de sentidos históricos, não obstante atuais planos empresariais de sustentabilidade, e como estas palavras foram sendo coradas ao sol bondoso e sem limites do patriarca, que também era, dizem-nos…